Fabricantes de veículos com fábricas no Brasil estão prestes a solicitar a investigação de possível prática de dumping por empresas chinesas que importam automóveis para o país. A medida, que deve ser encaminhada ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Mdic), é liderada pela Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) e envolve tanto veículos de passeio quanto caminhões, ônibus e máquinas agrícolas e rodoviárias.
O foco principal da ação são as montadoras BYD e GWM, que devem inaugurar fábricas no Brasil em 2024. As duas empresas chinesas comercializaram juntas mais de 106 mil veículos eletrificados neste ano, representando 60% das importações do segmento e 22,7% do total de veículos importados.
A GWM afirmou que está tranquila em relação ao processo, assegurando que segue todas as normas do comércio internacional e da legislação brasileira. Já a BYD negou a prática de dumping e destacou que seu complexo industrial em construção na Bahia será o maior da marca fora da China. A empresa criticou as montadoras tradicionais, alegando que elas deixaram o setor automotivo brasileiro em segundo plano e agora tentam barrar a concorrência.
O presidente da Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE), Ricardo Bastos, ressaltou que a investigação de dumping está prevista nas regras da Organização Mundial do Comércio (OMC). Segundo ele, não há indícios de distorção nas relações comerciais entre Brasil e China, mas, se a investigação envolver veículos eletrificados, a entidade contribuirá com o processo.
A Anfavea argumenta que o aumento das importações ameaça a produção nacional e compromete empregos e investimentos em tecnologia. A participação da China no mercado brasileiro de veículos importados saltou de 12% em 2023 para 26% em 2024. Para o presidente da entidade, Márcio de Lima Leite, o volume excessivo de importações pode prejudicar o desenvolvimento do setor automotivo no Brasil.
Investigação segue modelo europeu
A ação contra as fabricantes chinesas no Brasil segue um modelo semelhante ao adotado pela União Europeia, que investiga acusações de dumping desde 2023. No ano passado, o bloco europeu impôs tarifas de até 35% sobre veículos elétricos chineses, além dos 10% já cobrados anteriormente.
No Brasil, a discussão ganhou força após a importação de quase 100 mil veículos chineses antes do aumento da alíquota do Imposto de Importação, em julho. Segundo a Anfavea, cerca de 50 mil unidades continuam estocadas nos portos brasileiros. O setor automotivo alega que esses veículos estão sendo vendidos a preços inferiores aos praticados na China e em outros mercados.
A Anfavea também se preocupa com novos aumentos nas importações antes da próxima elevação da alíquota do Imposto de Importação, prevista para julho. Atualmente, a taxa está em 18% e voltará ao patamar de 35% em 2026. A entidade tenta convencer o governo a antecipar esse reajuste.
Licitações públicas também são alvo
Além da concorrência no setor automotivo, a Anfavea pretende questionar licitações públicas para aquisição de máquinas no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Segundo a entidade, muitas compras têm sido direcionadas a empresas estrangeiras sem presença industrial relevante no Brasil.
Um estudo em andamento aponta que, em 29 licitações analisadas, 32% das máquinas adquiridas vieram de empresas estrangeiras com pouca estrutura local. O presidente da Anfavea classifica o cenário como uma “invasão de máquinas importadas” e defende mudanças na legislação para fortalecer a indústria nacional.
Em 2023, o Brasil importou 26,4 mil máquinas agrícolas e rodoviárias, um número três vezes maior que em 2020. Mais da metade dessas importações veio da China, enquanto outros 26,4% vieram da Índia. Para a Anfavea, esse crescimento ameaça a produção nacional e a competitividade da indústria brasileira no mercado global.